sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Memória

A tarde morria para abrigar a noite, o céu alaranjado fogo dizia que a madrugada seria fria. Sentada na varanda ela olhava tudo aquilo saudosa, não sentia o cheiro de terra recém-molhada, a brisa não acariciava sua face e nem mesmo o cheiro de roça invadia suas narinas, mas mesmo assim ela sentia tudo isto bem próximo. Não sabia explicar bem o por quê.

A saia até os joelhos fazia conjunto com a blusa branca de botões, os óculos na ponta do nariz em forma de batatinha estava embaçado, mas ela ainda conseguia enxergar muito bem. Acariciava a foto com muito carinho, como era bom saber que um dia ele existiu. Respirou profundamente e tornou a olhar o horizonte. Ali da sacada do décimo quinto andar era fácil enxergar ao longe. O céu já estava negro, mas nenhuma estrela era vista, ela forçou um pouco o olhar e vislumbrou muitas delas, milhares que jamais poderiam ser relatadas, sorriu. Acomodou-se na cadeira e devagar fechou os olhos.

O vento lhe tocou os cabelos brancos, os lábios enrugados e as mãos. Ela puxou o chale para mais próximo do corpo, encolheu um pouco as pernas se protegendo do vento frio. A fotografia em seus dedos insistia em ir embora, mas ela a segurava com firmeza. Mantinha-se quieta, além do assobio do vento mais nada era ouvido.
Devagar ele veio, tocou-lhe a face delicadamente, acariciou seus cabelos. A saudade que sentia não pode ser expressa em palavras, suspirou e se abaixou. Devagar a ergueu da cadeira e ela por instinto aninhou-se em seu pescoço dizendo baixo:

— Ansiei tanto por este dia, que bom que ele chegou.
— Não diga nada querida, poupe-se a viagem será cansativa.

Ao dizer isto uma luz se abriu e ele caminhou devagar, ela voltara a dormir e seu semblante era sereno. A passagem foi tranquila, a foto voou ao sabor do vento. O corpo que guardava aquela alma permaneceu encolhido na cadeira. O vento, agora brando, despenteava os cabelos, arrancava o chale e levava a saudade para longe.

FIM 




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