O sol morre preguiçoso no
horizonte, debruço na janela e olho a rua, meu coração está acelerado, passará
por emoções fortes em breve. Quando o sol termina seu espetáculo particular ele
aponta na esquina, a boca fica seca, minhas pernas tremem, meus olhos brilham e
a mão sua fria.
Junto minhas mãos e respiro
fundo, como acontece todo o dia, ele
pára em um dos bares, fico a observar e
após secar seu copo ele se despede. Afasto-me da janela ao perceber sua
aproximação. Devagar me encaminho para a sala, ligo a tevê e simulo estar vendo
atenta a novela, faço isto todos os dias.
Ele entra e me olha devagar,
observa meu cabelo, minhas pernas, meus olhos. Em silêncio ele caminha para o
banho. Sabendo o que devo fazer me levanto e vou para a cozinha, verifico novamente
o jantar e faço os ajustes finais. Ouço-o sair do banho, o cheiro do sabonete
invade a casa.
Posto a mesa, faço o prato dele e
me sento verificando a forma que ele mastiga, observo atenta aonde ele leva as mãos. Tudo é muito rápido e isto me deixa
feliz, uma das mãos toca a barriga e chega até a garganta, seus olhos negros se
arregalam para mim, eu apenas sorrio. Ele puxa a ponta da toalha da mesa com a
outra mão, joga tudo no chão, a mistura do molho com suco de morango faz
desenhos inexpressivos no chão. Ele cai espalhando os desenhos em torno de se,
seus olhos agora não exprimem nada, as unhas ainda encolhidas ferem a pele do
pescoço.
Aguardo alguns minutos e me
retiro, vou até o quarto e pego a mala e o dinheiro, aguardei por este momento
a exatos cinco anos. Antes de sair do quarto olho-me no espelho, a maquiagem
não esconde completamente os arroxeados nos meus olhos, mas a roupa comprida
esconde as marcas no meu corpo.
Aproximo-me novamente do corpo,
vê-lo ali indefeso só aumenta o meu prazer. Toco-lhe a face retorcida, acaricio
sua pele ainda quente. Observo os cabelos e suspiro dizendo a mim mesma.
—Por que me obrigou a isto? Eu
lhe amei tanto!
Sem peso na consciência despejo o
liquido em cima dele. Observo ele escorrer até a varanda. Enfio um pedaço de
pano em sua boca. Tiro as luvas, pego a mala, desço os degraus devagar, antes
de fechar o portão acendo um cigarro, descuidada jogo o palito, ainda acesso,
na varanda. Sorrio e caminho despreocupada, o vento beija meu rosto. Não olho
para trás, não quero saber o porquê tantas pessoas gritam. Hoje eu me libertei.
Fim