sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Duelo

O sol estava quase a pino, nenhum som era ouvido. Das janelas das casas todos espiavam curiosos, assustados. O povoado já deveria ter se acostumado, duelos eram tão comuns por ali, porém nenhum deles fora motivado por uma donzela.  Os olhos assustados dela corriam de um lado para o outro, não tinha como fugir, estava amarrada de pé a um tronco de madeira.


Do lado direito da rua, estava Billy Sarnento com sua calça de franjas e chapéu branco. Seu olhar era duro, ele havia vencido todos os duelos dos quais participara. Na outra extremidade estava Corcel Bravo, usava uma calça típica dos índios americanos, tinha o peito nu e sua pele vermelha brilhava ao sol. Na cabeça havia apenas um arco com uma pena azul.  


Faltava pouco para o meio dia, e agora ambos se posicionavam para o embate. Billy segurava sua arma com firmeza e sorria debochado, Corcel por sua vez estava inseguro, não era bom com armas, mas tinha coragem de sobra. A donzela aprisionada era sua irmã, e ele daria a vida por ela. De longe Billy gritou:

— Está pronto frangote? O sol está muito quente!
— Frangote é você, sempre estou pronto.

Corcel mal terminou suas palavras e Billy se posicionou, levantou o bico do chapéu e mirou para o peito de seu oponente, este por sua vez respirou fundo e...

— Vitor, Laura vem almoçar, agora!
— Caio vem lavar as mãos, sua comida já está no prato.
— Ahh não mãe! A senhora sempre faz isto!
— Hahah! Sua irmã continua sendo minha,  seu frangote.
— Para né Caio, desta vez eu ia ganhar, minha mãe que atrapalhou.
— Vamos logo, amanhã a gente continua.

Laura puxa o irmão pelo braço e se despede de Caio. Quando o dia raiar um novo duelo decidirá o destino da bela Libélula do Alvorecer.

                                                                              FIM

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

DEUS NÃO ACEITA ISTO, NUNCA TERÃO À BENÇÃO DIVINA. IMUNDOS

O cartaz em letras garrafais tornava a cena mais desestimulante. Vozes de todas as idades se  misturavam na confusão. Muito barulho, muitos insultos. Aquela seria, com certeza, uma tarde inesquecível para a pequena cidade de Ruralzinho. O jornal local não teria muito que contar, com certeza aquilo era mais “inacreditável” que E.T’S e boa parte dos moradores eram testemunha ocular do acontecimento histórico.

— Ainda bem que as portas são grossas. – Uma senhora de cabelos brancos sussurra para sua colega.

— Pois é Zinha, o povo não aceita e sendo sincera não entendo bem a situação, mas o amor deve sempre falar mais alto. Não é mesmo?

— Sim comadre. Não tinha mais como esconder e se agora é lei, quem somos para condenar, até o padre aceitou abençoar a união.

Uma suave musica encheu o lugar de alegria, das pesadas portas surgiu um rapaz alto, de cabelos ondulados, terno branco e um sorriso doce. Ao seu lado um senhor não muito baixo, cabelos grisalhos e óculos finos. Seu sorriso era nervoso, ele olhava todos e balançava devagar a cabeça. As rosas amarelas e vermelhas formavam uma harmonia perfeita naquele lugar, pois o  amarelo simboliza a amizade e o vermelho amor.

No altar o outro estava mais nervoso, seu terno azul escuro demostrava todo o respeito que deveriam ter por ele, tocou de leve a mão que lhe foi oferecida pelo senhor de óculos. Os olhares se encontraram e ambos sorriram extasiados. As palavras foram proferidas e ao final um SIM selou a união. A “noiva” chorou muito, como é de se esperar. A cerimônia terminou, mas o burburinho continuava. Carros rumaram para a festa e uma nova vida começava.

A cidade falou do acontecido por meses e meses, as pessoas nunca aceitaram aquela união. O casal era alvo de insultos, preconceito e desprezo. No fundo eles não se importavam, o amor era mais forte e se esconderam por muito tempo até realizarem o sonho. Pensavam em adotar uma criança, Alberto sempre quis ter um filho, Gilberto achava cedo, queria curtir um pouco mais a lua de mel.

O fogo consumiu a bela casa, os bombeiros demoraram demais. No rosto do pai de Gilberto a tristeza da derrota, a mãe de Alberto gritava por justiça. Os moradores em silêncio comemoraram a atitude, haviam feito um favor para a cidade.

Nos jornais uma nota fria falava por todos os moradores. Ruralzinho voltou a ser um lugar digno de se morar, ninguém assumiu a autoria da covardia. A justiça investiga, mas sem ajuda será difícil encontrar os culpados. Na praça, escola e botecos o assunto é o mesmo. Os novos e os velhos não se dão ao trabalho de entender a pureza do amor e pior esqueceram o que é respeito.
                                                                     


FIM        






domingo, 11 de setembro de 2011

Ousadia de Catarina

— Ele nunca mais vai me esperar na porta, quando eu chegar da escola, nunca mais ele dormirá debaixo da cama nos dias que eu pensar que tem um bicho – papão dentro do armário.
— Calma filha, compraremos outro cachorrinho. – Dizia a mãe carinhosa.
— Não quero outro cachorro, quero o meu Vlad. – Disse ela teimosa com sua voz esganiçada.
— Mas o Vlad agora é da Dona Morte. – Disse a avó tranquila.

Catarina olhou para a senhora por um segundo e franziu a testa, ponderou um tempinho e disse meio assustada.

— Por que ela gosta tanto das minhas coisas? Por que ela mesma não arruma seus bichos de estimação?
— Você não sabia que tudo o que temos é da Dona Morte? – Perguntou a avó.
— É? Mas por quê? – Perguntou a menina, enquanto limpava a meleca do nariz bem vermelho.
— Bem a Dona Morte é parceira do Papai do Céu. Os dois cuidam de todas as coisas. Só que Papai do Céu, antes de nos entregar as coisas, coloca um prazo de validade e a Dona Morte é a fiscal. Acabou a validade ela vem e leva de volta.
— Validade, como os meus biscoitos tem?
— Exatamente.  Quando o prazo de validade acaba, ela leva de volta para que seja substituído por outro mais novo.

A menina  foi para o quarto e pensou muito sobre aquilo, no fundo do quintal seu pai cavava a sepultura de Vlad. Ela sempre teve medo da morte, desde o dia que ela levou seu peixinho dourado. Porém, ela não sabia do prazo de validade. Ficou ali sentada no chão, perto da cama pensando, e de repente deu um salto. Foi até sua mochila e pegou um caderno, o que tinha as folhas mais bonitas e seu lápis novo. Sentou-se na escrivaninha e escreveu devagar.

“ Dona Morte, tenho muito medo da senhora! Afinal de contas todos os meus bichinhos de estimação a senhora levou. Minha avó contou para mim hoje que a Senhora só leva os bichinhos que estão vencidos, eu não sabia disto. Estou escrevendo este bilhete para pedir a Senhora que cuide bem do Vlad e que peça ao Papai do Céu para acelerar a validade dele. Se eu puder escolher, quero que desta vez ele tenha uma mancha preta nos olhos, mas que seja o meu amigo de sempre.
Mesmo com medo quero dizer obrigado por cuidar do prazo de validade. Seu trabalho é importante.
Um abraço da Catarina.”

O bilhete foi colocado na pata dianteira direita de Vlad.  Apesar do medo que sentia da morte, ela confiou que a Dona Morte, com certeza falaria com Papai do céu para enviar bem rápido seu Vlad com validade aumentada.

FIM


O lá e o agora

A lua decorava um céu de poucas estrelas, lá embaixo em um bar não muito sofisticado encontrava-se Bela. Uma garota que apesar do nome, não tinha como maior virtude a beleza, seus cabelos eram volumosos devido aos vários cachos. Levava no olhar uma tristeza enorme, quando sorria este sorriso não se refletia no olhar. Avaliando mais profundamente, ela era apagada.

Em seu interior guardava uma chama verde, tinha a esperança como fiel guiadora. Sentia se impotente perante a vida, mas mesmo assim resistia bravamente. Hoje ela terá que fazer uma escolha, mesmo que ela nem imagine que tenha opções. Atravessou a avenida movimentada, olhou a placa e confirmou o endereço. Estava ansiosa.
Adentrou o restaurante e foi guiada pelo garçom até sua mesa. Sorriu para o rapaz que lhe aguardava, sentou-se o olhando fixamente. Disse em seguida:

— Foi uma surpresa agradável seu convite, não esperava mesmo por isto.
— Bom lhe chamei para este jantar, por que precisamos conversar sobre um assunto muito sério.
— Assunto sério? Pode falar, sou todo ouvido.
— Serei direto, não quero que você faça escândalo, chore ou dê pulinhos. Falarei e sairei e, por favor, não vá atrás de mim.

Ela ouviu tudo, em seu intimo esperava outra noticia. Ele realmente não a conhecia, mesmo após tantos anos dividindo uma mesma vida. Ela pensava ser uma mesma vida, como esteve enganada. Dedicou-se a ele por tanto tempo e agora estava ali sentada sozinha, jogada no bar como uma coisa que não tem mais utilidade. Lágrimas silenciosas banhavam seu rosto, ela não sabia exatamente o que fazer. Chamou o garçom, pagou a conta e saiu meio sem rumo. A solidão devorava seu ser, tinha certeza que tinha encontrado quem iria lhe preencher, como estava enganada.

Caminhou a passos vacilantes para a noite chuvosa, não abriu a sombrinha, deixou a chuva estragar toda sua produção. A maquiagem borrava sua face, os pés faziam um barulho estranho devido à quantidade de água que guardavam dentro de si. Ela caminhava pesadamente, a saia grudava em seu corpo, a blusa de manga pingava água. Não observou a avenida ao atravessar, estava em outra dimensão. Um farol, uma buzina e o corpo da infeliz foi arremessado para longe.
Uma sirene enlouquecida, agua negra sendo arremessada para longe. Eles contra o tempo, oxigênio, ataduras, coletes, nada fora esquecido. Um olhar pesado e uma negativa para o outro, não tinham para quem ligar.

§§§

— Como eu vim parar aqui? –Ela se perguntava olhando desesperada para suas roupas.

Não obteve resposta, andava por uma mata fechada, não conseguia ver o céu, estava tudo muito bem iluminado. Observou devagar a copa das árvores, olhou o chão e achou estranho ele não ser marrom ou talvez verde. Parecia estar caminhando na agua, mas não havia água ali. Não ouvia nenhum som, via apenas árvores enormes, que se perdiam num céu inexistente.

Aquela situação lhe causava angustia, queria encontrar alguém. Sentou-se debaixo de uma árvore, sentiu a textura do chão, ele realmente era corrente. Seus olhos pesaram e ela adormeceu. Quando acordou assustou-se ao perceber um enorme espelho em sua frente. Tocou-o devagar e ele acendeu como que por mágica. Pousou seus olhos tristes no mesmo. Um filme de sua vida começou a ser exibido, desde o nascimento até o ultimo momento que se lembrava. Chorou muito, muito, esvaiu-se em lágrimas. Sentiu a garganta fechar, o ar lhe faltar. Uma forte pressão atacou seu coração e ela desejou a morte. No seu desespero solitário sentiu uma mão tocar-lhe o ombro, virou-se e viu alguém, porém este alguém não tinha rosto. Ficou atônita lhe fitando o nada, então uma voz suave banhou lhe o corpo por completo e ela se acalmou.

— Você está aqui para fazer uma escolha. – Falou a voz macia.
— Que tipo de escolha? Não entendo! – Disse a moça fixando o olhar no vazio.
— Entre o lá e o agora. – Disse a voz apontando para o espelho e o infinito.

Ela olhou para o espelho e o filme, desta vez, passou bem devagar, ela pode perceber os raros momentos felizes que teve. Visualizou rostos que a muito foram esquecidos. Reviu lugares que não se lembrava  quando visitou. Lembrou-se que possuía um belo sorriso, sentiu alegria ao rever um abraço amigo. Seu coração bateu forte ao rever seu maior desejo, suspirou baixo. Tudo foi passando lentamente, reviu o primeiro beijo. Descobriu neste meio que a muito era enganada, seu coração pulou ao rever lentamente seu ultimo momento. Desta vez segurou as lagrimas, não teria pena de si mesma.

— Viu como a calma é poderosa? –Sussurrou a voz etérea.

A moça não pronunciou palavra, apenas fixou o vazio e perguntou.

— O que devo escolher?  
— Deve decidir para onde quer voltar, para lá ou viver o agora. – A mão do corpo sem rosto tocou-lhe agora nas mãos, ela sentiu uma onda elétrica passar por seu corpo e tudo começou a girar.
— Por que tudo está girando? O que aconteceu?
— Deve decidir agora, estão lhe levando para o lá novamente. – A voz se distanciou.  
— Como faço a escolha? – Ela perguntou quase gritando.
— Pense no que deseja e se deixe levar. – A voz sumiu no redemoinho a sua volta.

§§§

Bip...bip o som calou-se trazendo tristeza aos olhares.
— Nós a perdemos, não existe mais o que fazer.
— Sim, a bolsa foi encontrada. Teremos para quem ligar agora.
— Deixe-me ver a foto da identidade? – Pediu uma moça, de olhar vivo.
Ela olhou demoradamente a foto e disse sorrindo:
— Pensei que o estrago era por causa do acidente, eu estava enganada. – Entregou a carteira para a outra.
— Você é muito maldosa, deveria pensar no futuro, no agora. Ninguém sabe o que nos espera lá.
— Você é boba, morreu acabou. A terra come e pronto. – Disse a outra dando de ombros.
— Se você pensa assim, problema seu.
§§§

Ela desejou segurar aquela mão novamente, sentir a eletricidade percorrer seu corpo novamente e assim aconteceu. O ninguém se transformou em alguém. Seu rosto era belo, na mais simples das belezas. Ele lhe sorriu e ela por sua vez não teve receio de sorrir. À medida que caminhavam uma cidade ia se formando, o chão se tornava áspero e ela podia ouvir sons. Seu coração estava alegre, sentia-se completa.

FIM








sábado, 10 de setembro de 2011

Não é

O verde de várias tonalidades dava ao local um ar mais leve, o contraste com o azul do céu tornava aquele local único em todo o universo. Aguas cristalinas refletiam a riqueza local, delicadas pedras que continham em sua superfície uma camada espessa de musgo, livre de poluição, dava ao caminho uma atmosfera surreal. Ruínas imensas ornamentadas por trepadeiras floridas, elas forçaram passagem há muito tempo, não foram delicadas nesta invasão.

O equilíbrio é visível por toda a imensidão verde. Cada um ocupa seu espaço sem reclamar. Não existe desperdício, não existe estoque. Olhando com mais profundidade percebemos o que habita este local.
Mesmo que debaixo de tanto verde exista as relíquias da antiga civilização, é impossível crer que um dia ela foi dominante neste lugar. Grossos cipós amarram as partes mais densas, não é possível vislumbrar o azul nestes pontos. Uma fina névoa encobre um traiçoeiro pântano, que permeia uma vasta extensão. É possível ouvir gritos medonhos através da lama fétida. Não é um local seguro.
Sem aviso a paisagem muda, troncos gigantes e grossos se juntam. O verde sumiu, o marrom prevalece. 

Devagar o marrom vai se tornando branco, pequenos cristais coloridos quebram a monotonia local. Não existe abrigo seguro ali, só o vasto branco. O equilíbrio não é quebrado. Uma revoada muito baixa chama à atenção, um grito é proferido e o improvável acontece. Negro, apenas o negro, silêncio pavoroso.
Fim da transmissão

—Quantas vezes você vai rever esta gravação? – Um rapaz de tez macilenta pergunta abruptamente para uma garota muito pequena.
—Não seja pessimista, afinal é nossa origem, nosso mundo. – Responde a garota com um sorriso esverdeado.
—Um dia foi. Pelas fotos nem fazemos mais parte da raça, mudamos tanto. Você viu os ossos que encontramos na última escavação, estamos muito distante deles.
—Sim você tem razão, mas ainda pensamos e criamos como eles, nossa mente ainda é superior.
—Lembre-se, foi exatamente está habilidade que nos levou para a última fileira da evolução. Li vários livros e cheguei à conclusão que o mal somos nós.
—Irmão você está equivocado, podemos viver com eles. Em harmonia.
—Não podemos, o ato de pensar é nocivo.

Um bip alto é ouvido e o coração de ambos bate descompassado, uma luz azulada invade as retinas assustadas e tudo é reduzido a pó.
Silêncio e poeira. Quem disparou é visto assim que o ar se limpa, são seres medonhos. Seus corpos não tem uma forma definida, os olhos são negros. Lembram uma massa uniforme de lama. As vozes são guturais e seu poder é dominante em tudo que é vivo.
—Eram os últimos, tenho certeza. –Fala o primeiro guardando a arma no corpo.
—Vou conferir. Você disse a mesma coisa da última vez. –O outro se molda ao pó reinante e arrasta vasculhando todo o perímetro.

Tudo no local parece obedecer ao comando da criatura. Pedras, musgos, visgos falam num murmúrio que ali não existe mais “homens”. A criatura volta ao seu formato uniforme e leva o outro consigo.
—Não existe mais destas coisas neste local. Nossa vitória está próxima. – Rastejam deixando um caminho marrom espesso.

Bem antes de serem exterminados, os moradores daquele local mandaram um alerta. Um fio translúcido percorreu quilômetros abaixo da terra. Escolheu os pontos com precisão, assim a mensagem foi recebida em seu destino. Não se sabe quando e nem como, mas eles não desistirão. Um dia aquilo que lhes pertenceu voltará a seu comando. 

FIM


sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Memória

A tarde morria para abrigar a noite, o céu alaranjado fogo dizia que a madrugada seria fria. Sentada na varanda ela olhava tudo aquilo saudosa, não sentia o cheiro de terra recém-molhada, a brisa não acariciava sua face e nem mesmo o cheiro de roça invadia suas narinas, mas mesmo assim ela sentia tudo isto bem próximo. Não sabia explicar bem o por quê.

A saia até os joelhos fazia conjunto com a blusa branca de botões, os óculos na ponta do nariz em forma de batatinha estava embaçado, mas ela ainda conseguia enxergar muito bem. Acariciava a foto com muito carinho, como era bom saber que um dia ele existiu. Respirou profundamente e tornou a olhar o horizonte. Ali da sacada do décimo quinto andar era fácil enxergar ao longe. O céu já estava negro, mas nenhuma estrela era vista, ela forçou um pouco o olhar e vislumbrou muitas delas, milhares que jamais poderiam ser relatadas, sorriu. Acomodou-se na cadeira e devagar fechou os olhos.

O vento lhe tocou os cabelos brancos, os lábios enrugados e as mãos. Ela puxou o chale para mais próximo do corpo, encolheu um pouco as pernas se protegendo do vento frio. A fotografia em seus dedos insistia em ir embora, mas ela a segurava com firmeza. Mantinha-se quieta, além do assobio do vento mais nada era ouvido.
Devagar ele veio, tocou-lhe a face delicadamente, acariciou seus cabelos. A saudade que sentia não pode ser expressa em palavras, suspirou e se abaixou. Devagar a ergueu da cadeira e ela por instinto aninhou-se em seu pescoço dizendo baixo:

— Ansiei tanto por este dia, que bom que ele chegou.
— Não diga nada querida, poupe-se a viagem será cansativa.

Ao dizer isto uma luz se abriu e ele caminhou devagar, ela voltara a dormir e seu semblante era sereno. A passagem foi tranquila, a foto voou ao sabor do vento. O corpo que guardava aquela alma permaneceu encolhido na cadeira. O vento, agora brando, despenteava os cabelos, arrancava o chale e levava a saudade para longe.

FIM